Caras Amigas e Caros Amigos,
Com algum bom senso percebi que precisava afastar-
-me um pouco dos “mil papéis” à minha volta para, com
alguma distância, poder pensar melhor naquilo que esses
“mil papéis” representam no meu quotidiano.
Quase me tinha esquecido da Mãe Natureza, da sua presença
generosa e acolhedora: a Lua Cheia de Luz, as ondas
do Mar exalando um aroma estonteante, os pássaros a
atravessarem, felizes, os ares… proporcionaram-me um
reencontro comigo.
Pernas estendidas, uma simples espreguiçadeira – em
frente a magia da Serra da Malveira – práticas socialmente
merecidas que fazem emergir o pensamento mais sério e
profundo, ajudaram-me a tomar consciência de como o
ano de 2018 tem sido um ano exigente, com percursos de
realização muito intensos.
A máquina do tempo não pára, provocando uma exaustão
que nos retira a possibilidade de ser o que somos, para nos
fazer autómatos escravos das circunstâncias. Aí começa
muitas vezes o desencanto, que se associa à incapacidade
de fazer interpretações justas do real, e fazendo-nos correr
o risco do desmantelamento do poético, do ritual, da
magia, do simbólico, do Ser.
O mundo parece-nos estranho, sem autenticidade, a caminho
do caos!... É aí que, contrariando a “tecnologia sem
rosto”, o ser humano pode intervir numa outra dimensão
de temporalidade e de práticas, convocando modos de
fazer, de pensar, de escrever, de agir, mais próximas da
corrente da Vida, cósmica, social e culturalmente relevantes
– seremos os “Artesãos da Vida”, a tecer uma trama
inclusiva onde caibam todas e todos os que querem
caminhar no sentido da justiça e da equidade. É a única
forma de evitarmos, militantemente, o “terramoto social”!
Com um apelo à Coragem, à força anímica que nos constitui,
e com alguma ousadia, vamos dar mais um “passo
à frente” – podemos desacelerar para pensar melhor, mas
não podemos parar, não podemos olhar para trás!
O Projecto Chapitô nos Centros Educativos manteve as
suas actividades com os jovens privados de meio social,
com total empenho e dedicação profissional da Equipa,
provando cada vez mais a importância das Artes do Circo
como factor de inclusão social – e cada vez mais surgem
jovens talentosos que fazem passar pela nossa Escola o
seu projecto de vida.
Na Escola de Circo do Chapitô finalizámos mais um ano
lectivo, marcado positivamente pelos espectáculos públicos
construídos pelos nossos alunos, orientados por uma
excelente equipa de professores e de artistas, e em parcerias
virtuosas em que se destaca o Lisbon Cruise Terminal.
Em paralelo, durante este mês de Agosto, redobrámos as
tarefas de manutenção – a “Brigada Anti-Ferrugem” e uma
equipa muito variada de alunos e colaboradores puseram
mãos à obra e, com todo o empenho, prepararam a abertura
da Casa para Outubro.
Na Tenda do Chapitô, os ex-alunos que concluíram o nosso
Curso de Artes do Espectáculo, apresentaram aos fins
de semana a criação “Inóspito”, um espectáculo circense
que aborda de forma lúcida e poética a problemática
dos refugiados. Cláudia Galhós, crítica de arte, escreveu
no Expresso Revista (p. 84, ed. 2391 de 25 Agosto 2018),
sobre este evento: “- Inóspito ou Acrobatas e Poetas contra
a Indiferença”. Entretanto prepara-se já para apresentação
pública, ainda em Setembro, um outro espectáculo de ex-alunas - “Para Além do Palco” – glosando, de forma crítica
e humorística, o mundo do “cabaret”.
Pela elevada qualidade das Provas de Aptidão Profissional
deste ciclo de formação que agora terminou cumpre-me,
enquanto Artista e Directora da Escola, deixar breves palavras:
- Amigas e Amigos, foram três anos de corpo-a-corpo,
muito vividos em exigência e rigor, entre treinos, ensaios,
apresentação de espectáculos, percursos que nos uniram e
que fizeram de vós pessoas de qualidade e artistas em ascensão.
Quero-vos muito bem e exorto-vos a seguirem
sem vacilar o caminho que traçarem. Valeu a pena todo o
nosso e vosso investimento! O mundo precisa das Artes:
na Rua, em Sala, no Palco, nos Bairros… as artes têm que
estar espalhadas por todo o lado!
Na Esplanada do Chapitô, durante este mês de Setembro,
vamos ter o “Chapéus há Muitos”, enquadrado pelo
Busking Festival produzido pelo nosso amigo Tiago e outros
companheiros.
E já agora lembrar, a propósito da intensidade de propostas
culturais em Lisboa, que o Chapitô foi percursor da
ideia de produzir pequenos filmes/documentários com
o mínimo de meios (por exemplo o telemóvel), tendo aliás
ganho um prémio europeu no âmbito do Festival Pocket
Movie em 2004.
No Bartô a música brasileira é rei e rainha, fazendo sínteses
entre o norte e o sul do mundo – é isso a cultura, o
cimento que nos une na solidariedade da Festa, celebrando
a vida em cada dia.
E muito mais haveria para dizer, porque o Chapitô é um
espaço de cruzamentos sem fim! Resta-me desejar uma
boa rentrée para todos, regenerados por este tempo curto
mas intenso de encontro com a Natureza, propiciador
de momentos de Felicidade, tão necessária e às vezes tão
distante!...